Vítima de violência doméstica dá a volta por cima e lança rede social para ajudar mulheres a se libertarem dos agressores
Karla dos Santos Nunes, de Vitória, deu a volta por cima. Depois de parar na UTI por se jogar da janela de um prédio fugindo de mais um dia de fúria do ex-marido, ela hoje tem um novo casamento e se diz feliz (na foto). Mas não é mais a mesma. "Acho que nunca mais serei quem eu era", lamenta.
Ela foi vítima de violência doméstica, chegou a ser hospitalizada mas deu a volta por cima. Depois de denunciar o ex-marido e conseguir descobrir a felicidade num segundo casamento, Karla dos Santos Nunes decidiu usar suas redes sociais para ajudar outras mulheres. “Estamos vivendo numa guerra sem fim e sem limites”, garante. Jornalista, Karla pode ser encontrada no Instagram pelo endereço @mulheres_denuncie.
Tudo começou em 2006, quando ela conheceu FSS. “Foi muito rápido. Começamos a namorar, fomos morar juntos e eu engravidei. Tínhamos aproximadamente a mesma idade: 23 e 24 anos. Levávamos uma vida normal. Ele foi carinhoso durante a minha gravidez, mas de vez em quando apresentava algumas coisas estranhas em seu comportamento”, recorda-se.
Segundo Karla, FSS tinha momentos de isolamento e depressões repentinas. “Perguntava o que estava acontecendo e ele dizia que não era nada, que era coisa dele. Era um homem muito inteligente mas de pavio curto, o que fazia com que não parasse nos empregos”, continuou.
Em 2008, Karla e FSS se casaram numa igreja. O filho já tinha dois anos de idade. A família se mudou para São Paulo, local de origem do então marido.
“Eu era uma mulher muito apaixonada. Por isso, relevava as brigas, mesmo sendo violentas. Sei que desde o início tive sinais de que algo não era normal em seu comportamento, mas ignorei. Achei que com o tempo ele poderia melhorar”.
As agressões se tornavam cada vez mais constantes. “Sofria calada e não contava para ninguém. As pessoas desconfiavam porque viam roxos na perna, no braço, nunca no rosto. Às vezes tinha roxo nas costas, porque ele me dava chutes”, contou.
Karla sempre perdoava o ex-marido. “Ele dizia que me amava demais, que extrapolou. Nós tínhamos um filho e eu não queria o fim do casamento. Mas a violência evoluía de forma muito repetitiva e os problemas ficaram insustentáveis”, informou.
Chegou um momento em que Karla não estava mais aguentando e chegava em casa orando, pedindo orientações a Deus de como proceder. “Não tinha religiosidade mas buscava falar com Deus porque era difícil. Estava num emprego novo e o ciúme era grande. Ele me agredia verbalmente, psicologicamente e financeiramente também. Dizia que meu salário era dele e tomava de mim”, relatou.
Na nova empresa, em 2014, Karla precisava entrar de madrugada. “Eu era operadora do centro de controle de rodovias do Estado. Entrava 4h da manhã e saía às 14h. Tínhamos um ônibus fretado para fazer nosso transporte. Já tínhamos dois filhos. O mais velho já estava com quase nove anos e o mais novo era um bebê de um aninho. Tudo acontecia na frente das crianças. Entrei em casa apanhando. Não me esqueço o dia”.
O motivo da agressão foi um chuveiro. Karla não queria os filhos criados naquele ambiente e pedia orientação a Deus. “Naquele dia eu reagi. Decidi enfrentá-lo e me defendi. Entramos numa luta corporal intensa e a casa ficou toda quebrada. Começamos na cozinha, na área de serviços e partimos para a sala”, contou.
Foi quando Karla pegou uma faca para coagi-lo e conseguiu ligar para a polícia. “Ele saiu do apartamento e eu troquei o miolo da fechadura. Fui à portaria avisar ao porteiro que ele estava proibido de entrar em casa. Estava muito machucada porque recebi muitos golpes na cabeça. Perdi 20% da audição no ouvido esquerdo. Fui para a Delegacia da Mulher, fiz exame de corpo de delito, abri processos contra ele com muitas provas”, continuou.
Mesmo após todo este desgaste, Karla voltou a ser agredida. “Estávamos separados de corpos e dei entrada num pedido de divórcio. Ele não quis assinar. Passaram-se onze meses e tivemos outra briga intensa. Para fugir dele, me joguei da janela do prédio. Meu nariz já havia sido quebrado num soco. Na queda, quebrei os dois pés e a perna”, contou.
Karla foi parar na UTI da Unimed Vitória por dois dias. “Graças a Deus não tive grandes consequências, mas souberam da situação no meu trabalho e foi um grande constrangimento”.
Hoje, FSS é apenas passado em sua história. Mas um passado que deixa marcas que não cicatrizam. “Me casei novamente com uma pessoa maravilhosa. Thiago é tudo pra mim, meu grande amor. Ele cuida dos meus filhos, porque o pai deles não quis mais vê-los quando consegui aumentar a pensão de R$250 para R$450”, disse.
E continuou: “Fico triste pois meus filhos que se sentem abandonados. Eles são crianças maravilhosas. Éramos uma família linda, que ele estragou com a violência”. O pai também se casou novamente e terá um novo filho. Ele conta outra história a meu respeito. Sei que sua esposa me odeia. Quanto a mim, nunca mais fui a mesma. Tenho sequelas emocionais que não se reparam com facilidade”, confessou.
A conta no Instagram é uma espécie de autoajuda. Serve para desabafar. É um grito. Mas também é um socorro a outras mulheres que sofrem como ela sofreu e precisam de coragem para se libertar. “Sei que essas mulheres nem imaginam o quanto é possível ser feliz”, concluiu.